O escritor

coisas de amor


No papel escrivinhou
um futuro para si.
E ao primeiro que mostrou,
logo, logo, foi rasgado,
sim o papel, o escrivinhado,
picotado foi pro chão.
E depois veio a vassoura,
e depois veio a sacola,
e depois chegou à rua,
e depois ao caminhão.
Foi dali para um aterro,
e com chuva e muito vento,
não resistiria ao tempo.
Mas ali havia amor,
tanto amor, mas tanto amor,
que do pó do escrivinhado,
bem ali nasceu uma flor.
Flor tão bela, mas tão bela,
que o primeiro que passou
logo, logo foi arrancá-la.
E nas mãos daquele bruto,
foi ao rosto de uma dama.
Foi então fotografada
e voou voou voou.
No extravazar de uma brisa,
foi distante, bem mais longe
do que alguém jamais sonhou.
O atlântico atravessou
cegonhando uma semente
toda a vida que faltava
no quintal de uma casinha
na esquina da quadra doze
Daquele já não tão bruto
nem novo trabalhador.
Olhando pela janela
viu a dama, duas crianças
e pensou: uma família.

_

Rafael Picanço, 18 de Setembro de 2015.